segunda-feira, 31 de maio de 2010

Troca-Troca ou não troca

Passamos a nossa vida na base do troca-troca. O ser humano gosta muito de trocar e se trocar, não é à toa que tem gente que vive botando as calças e calçando as botas ou trocando os pés pelas mãos. A mania de se trocar às coisas está tão em alta que até os casais já estão embarcando nesta onda, se não fosse assim as casas de swing não estariam tão na moda. Trocamos a saúde por trabalho, o trabalho por dinheiro e o dinheiro por saúde em um eterno ciclo vicioso e dispendioso.

Na política muitos trocam seu voto por um punhado de mentiras, e viva a democracia! (recheada de demagogia que envolve toda uma pandemia de corrupção universal, o pior é que a contrapartida é ainda mais brutal). Por sinal, quando se refere à política parece que estamos sempre trocando três unidades de seis por trios de meia dúzia.

Trocamos nosso tempo de vida, que escorre pelos ponteiros dos relógios pendurados nas paredes de nossa história, para ficarmos inertes na frente de uma tela, olhando cada vez mais comerciais travestidos de novelas. Entretenimento de graça? Só se o seu tempo não valer nada.

A cada dia nossas células vão se trocando em nossos corpos como se dançassem em harmonia, embaladas por uma estranha sinfonia. Vamos substituindo a inocência pelo conhecimento, a juventude pela experiência, pois a experiência demanda tempo que envelhece o corpo, enquanto rejuvenesce o espírito, mas alguns preferem passar seu tempo vivendo seus dias bitolados e alienados, desperdiçando a centelha que os mantêm vivos, vendados para o mundo. São estátuas de carne e osso que movimentam os braços, mas não movimentam a mente.

Cada vez mais o troca-troca parece imperar em nossa existência. Trocamos de amor como quem troca de roupa, trocamos de emprego, de faculdade, de ideia, de partido, de ídolos, tudo num piscar de olhos.

Trocar nem sempre é substituir algo velho e obsoleto por algo mais atual e moderno. Muitas vezes trocamos o certo pelo duvidoso. E a cada troca tudo recomeça, sem que o antigo tenha conquistado a profundidade necessária para seu entendimento. É como ficar trocando de canais em uma televisão imaginária, sem dar a devida chance de se conhecer o que está passando de bom diante de si.

Se vamos trocar algo, que seja um gesto de ternura, um aperto de mão sincero, um pouco de carinho, uma palavra amiga. Troque sua atitude pessimista por uma chance de sorrir. Saiba o que e quando trocar, por isso não troque sua saúde por drogas, mas troque a droga da solidão pela solidariedade para com outras pessoas que precisam de você. Troque a indiferença por amor. Quando conspirarem contra você dizendo coisas do tipo: “troque a sua felicidade...”, apenas troque a expressão “troque” por “toque”, pois isto está ao alcance de suas mãos.

Enfim, jamais troque a oportunidade de ser feliz por alguma fútil promessa de ilusão, no truque do bilhete premiado, quem lhe engana é a sua própria ambição. Às vezes trocamos nossos tesouros inestimáveis (e por nós tantas vezes desvalorizados), por meros trocados, ao acreditarmos que estamos recebendo feijões mágicos.

terça-feira, 11 de maio de 2010

O Covil do Terror

          
Ele permanece imóvel. Ao seu redor a mais completa escuridão. O silêncio interrompido apenas pelas batidas de seu coração, e pelo som apavorante da criatura próxima a ele. Qualquer passo em falso poderá despertá-la.

A situação é critica. Ele tem que avançar, mas tem de ser com cuidado. Procura com as mãos as paredes do lugar.  Escuta um som. Algo se mexeu. Ele automaticamente congela. O medo toma conta de seu corpo. Sua respiração se interrompe para não denunciar que está ali.

“Agora falta pouco”, ele pensa. O suor escorre de seu rosto. Dá mais um passo. A esta distância já consegue perceber claramente um ronco animalesco a poucos metros de si. O que ele não daria para estar em outro lugar, poderia ser uma praia ensolarada ou quem sabe pescando. Mas o destino colocou-o ali. Se aquela fera acordar será o seu fim. Cada movimento deve ser meticuloso. Suave e lento, para não causar qualquer ruído desastroso.

Mais um passo. Ele tenta continuar, mas seus membros não querem obedecê-lo. Murmura de forma inaudível: “coragem, Adelar”. Como se fosse uma prece para dar-lhe forças de seguir adiante.

Agora tudo depende da sorte. Seus próximos movimentos terão de ser perfeitos. Ele respira fundo e começa a se curvar. Suas mãos viajam no escuro procurando algo em sua frente. Sua concentração é total. O pavor absoluto. Cada segundo parece uma eternidade.

Sua confiança aos poucos vai melhorando. Ele começa a ter esperanças de conseguir realizar o que antes lhe parecia uma proeza praticamente impossível.

Então algo acontece. Um barulho irrompe em meio ao silêncio, seguido de um clarão que cega os olhos daquele pobre arremedo de homem. Ele agora percebe que na sua frente está a criatura que tanto medo lhe causou. Gigantesca. Apavorante. A criatura tem os olhos cheios de ódio, parecendo que a qualquer instante irá saltar em cima dele.

Um som que mais parece um grunhido inumano e aterrador chega aos seus indefesos ouvidos, vociferando algo mais ou menos assim:

-         ISSO LÁ É HORA DE CHEGAR EM CASA, ADELAR? – SÃO QUASE DUAS DA MANHÃ! – ACHOU MESMO QUE IRIA SE ESGUEIRAR ATÉ A CAMA E QUE EU NÃO IA TE ESCUTAR, NÃO É? – MAS HOJE TU ME PAGA, SEU CAFAJESTE! VAGABUNDO! IMPRESTÁVEL...

(Pobre Adelar).